quarta-feira, 31 de março de 2010

Primavera chegou

Desde que cheguei a Barcelona minhas roupas se resumem a sobreposições de casacos e meias. Principalmente meias. Ninguém dá crédito pra minhas pernas. Acham que é tudo à base de enchimento. Em parte, é verdade.

Enfim, isso não vem tanto ao caso. O que importa mesmo é que as camadas de meias e de casados têm diminuído. E isso é um bom sinal. O calor está chegando. São muitos os indícios. Começando pelo lado oficial: o relógio foi alterado. Estamos uma hora a frente agora, o que representa 5 horas além do Brasil e quase 14 horas de sol por dia. Das 7h até quase 21h ele está lá, iluminando o céu barcelonês, radiante. Além disso, o clima de primavera já está no ar. O frio é um friozinho, não inclui mais aquele ar gelaaaado, cortante. O que mata, ainda, é o vento. Para os nossos programas preferidos de fim de semana ou de tarde, basicamente praia ou parque, isso é um detalhe fundamental. Engana. Você olha pela janela e vê o dia lindo lá fora, mas é só ficar um tempinho parada, ou ver o sol sumir, que lá vem o frio uma vez mais.

A mais importante mostra de que o verão está chegando é que Barcelona está ainda mais lotada de gente. Loiros e ruivos falando inglês, principalmente. Minha mãe!! Quanto turista há nessa cidade. Eu moro relativamente perto do Parc Guell, um dos pontos mais visitados na cidade. Esses dias presenciei a cena: uma fila interminável deles voltava do parque, descendo pelas estreitas calçadas de Gracia, em busca do "bus rojo", aquele que todas as cidades turísticas têm, e que os leva de um monumento a outro. Ah, e tinha fila também pra entrar no ônibus.

Decidi caminhar um pouco pelas Ramblas pra ouvir o linguajar turístico e me sentir orgulhosa por ser mais que uma visitante na cidade. Não dá. Andei trombando com a galera. Me refugiei numa loja, que encontrei por acaso. Incrível, por sinal. Casa de Música Beethoven. Curiosa: vende partituras de diversos artistas e grupos, dos clássicos mundiais, como o que dá nome à "tienda", ao atual e local "Sopa de Cabra. Livros sobre história da música, coisas raras.

Aí eu entendo porque tanta gente olha no mapa, quando decide tirar férias ou viajar no feriado da Semana Santa, como é agora, e escolhe Barcelona. Além das visitas manjadas, obrigatórias, a cidade tem muito mais a oferecer.

Não é mais do que bacana caminhar por "Las Ramblas" e dar de cara com um "Edward mãos de tesoura" que também sabe fazer cara de gato de botas? Isso é Barcelona! Que venha o verão!



domingo, 28 de março de 2010

Eu, Woody Allen e o Palau de la Música Catalana







































Eu sou capaz de pegar o metrô em vez do táxi ou de andar um montão a pé só pra economizar 2 euros, de olhar todos os preços no supermercado, para quase sempre comprar o mais barato. O que eu não sou capaz, quase nunca, é de perder oportunidades de viver experiências memoráveis. Hoje vivi uma delas.

21h. Estou eu sentadinha esperando que comece o concerto de ninguém menos que Woody Allen, acompanhado de sua banda de jazz, no nada menos incrível Palau de la Música Catalana. Poderia haver combinação mais especial?

O Palau é uma dessas jóias da arquitetura de Barcelona, que eu não me canso de admirar. Nunca tinha estado dentro e por isso resolvi chegar antes do show, pra poder observá-lo com dedicação. Foi o que fiz. De onde estava sentada, estrategicamente na lateral e no andar de cima, não tinha a melhor visão do palco, mas podia ver o Palau em todos os seus ângulos, cores e curvas. Boquiaberta, acomodei-me a esperar.

Estava tão besta, que não reconheci uma companheira do trabalho, que me cumprimentou e ficou no vazio, enquanto eu continuava no meu autismo olhando o teto, os pilares, os vitrais... Vergonha, não sabia o que fazer depois.

Em alguns minutos, os músicos entraram, tomando suas posições. Piano, violoncelo, bateria, metais. Os metais. Ele chegou assim, miudinho, andando devagar. Os cabelos brancos, aqueles óculos grandes, sapatos que parecem sobrar nos pés. Sentou-se e começou a soprar.

Nessa hora, eu já estava chorando. Foi imediato, assim que o pianista sentou a dedilhar. Não porque que a música fosse bonita. Também. Sim porque sempre que vivo experiências como essa imagino que não as podemos deixar passar nunca na nossa vida. A situação, basicamente, era a seguinte: eu estava sentada em um patrimônio histórico da humanidade, símbolo da arquitetura modernista catalã e com mais de 100 anos de história. Em cima do palco, a incrível banda de um gênio. Não sei dizer se ele é genial fazendo jazz, só sei dizer que ele é genial fazendo cinema e por isso eu estava incrivelmente feliz em estar ali, em dividir aquele espaço com alguém que fez o que ele fez.

Não à toa, me arrepiei e meus olhos se encheram de lágrimas quando ele disse: "É muito bom estar de volta. Barcelona é um dos meus lugares favoritos no mundo" Eu lembrei de "Vicky, Cristina, Barcelona", de como ele mostrou a cidade, de como eu me encantei com o filme, de como projetei minha vida aqui, de como a música ficou na minha cabeça. Lembrei de Match Point, Melinda & Melinda, Manhatan. Lembrei de que esse momento não sairia tão cedo da minha memória visual, auditiva, sentimental.

Lembrei que vivia em uma das cidades mais bonitas do mundo, e isso estava ainda bem fresco na minha memória, já que durante o dia, com o sol brilhando e a semana santa européia rolando, Barcelona estava lotada de gente, caminhando, olhando mapas, tirando fotos. Tenho um orgulho enorme de viver aqui. Um amor que adquiro a cada dia pela cidade, pela forma como surgiu, como foi pensada e estruturada. E pela forma como é possível descobrir nela uma coisa mais bonita todos os dias.

Eu sempre tento não deixar de viver experiências incríveis como a de hoje, nem que isso exija semanas de economia mais forçada. Vale a pena. Até porque tudo que é bom sempre exige mais esforço. Woody Allen merece. O Palau também. Meus ouvidos e meus olhos agradecem. Minha memória também.



segunda-feira, 15 de março de 2010

Itáaaaaaaaaliaaaaaaaaaa, má que?


Qualquer pessoa que eu conheço tem um pezinho na Itália ou conhece um monte de gente que tem. Eu tenho. Minha avó nasceu lá, bem no final do cano da bota, na comune de Massanzago, pronvíncia de Pádua, não muito longe de Veneza. Hoje em dia, mais de 80 anos depois dela ter deixado a cidade, a população é de menos de 5.000 habitantes. Imagina naquela época. Fora que fazia um frio desgraçado, me contava dona Tereza. Pra não passar mais frio, e nem fome, sua família decidiu embarcar com destino ao Brasil. E onde foram parar? Em Borborema.

Pelo visto, meus bisavós não gostavam muito de aglomerações mesmo.

Enfim, o que importa é que o sangue italiano é uma desculpa pra eu poder comer bastante macarrão, pizza, lasanha, gnochi, hum... e falar alto, gesticulando com a mão. Pelo menos é o que eu argumento quando alguém repreende meu volume um pouco exagerado.

Mas o que mais importa mesmo é que fiz uma visitinha relâmpago a este país vizinho e tãaaao peculiar.


Tudo começou no guichê pra alugar os carros. Tudo que perguntávamos, em inglês, o cara respondia em italiano ou suposto espanhol, não sei. Preocupadas com o fato de dirigirmos muito, pagamos por dois motoristas e ele cobrou por isso, mas nenhum documento provava quem podia dirigir. Ele disse que não tinha problema. Na estrada, 1.999.786 placas, uma em cima da outra, mostravam as diferentes direções para onde se podia ir. Quando nos decidíamos, nunca seguras de haver acertado, logo vinha outra placa que contradizia o que havíamos visto. Isso quando a distância até nosso destino não aumentava conforme avançávamos na estrada. Afe...
Chegando em Milão, eu dirigia, virando pra lá, voltando pra cá. Para ajudar, demos de cara com uma manifestação. Imagina o que são italianos barulhentos fazendo "barulho". Minha mãe.

Em uma esquina, não sabia o que fazer. Reticente, levei várias buzinadas e quando dei licença pro carro detrás passar, ouvimos uns palavrões que não entendemos perfeitamente a princípio, mas como o italiano possesso gritou sem parar e repetiu várias vezes, chegamos a conclusão de que seria algo entre "mongolóide"e "pata". Ou os dois. Tudo que fizemos foi ficar um pouco assustadas com tanto entusiasmo e rir.

Bom, a saga do carro durou a viagem toda. Nosso hostel em Milão, no estilo viagem perrengue, de quem economiza cada centavo, ficava a 8 quilômetros do centro da cidade, mas isso não especificava que havia um monte de obras no meio do caminho e que repetiríamos o mesmo caminho mais ou menos umas 15 vezes antes de encontrá-lo. No outro dia, rumo a Florença, fomos um pouquinho melhor. Demoramos a sair da cidade, mas logo nos encontramos.

Na volta, San Gimignano nos proporcionou aquela vista da Toscana dos filmes. Ainda bem que não estava dirigindo nessa hora. Pude admirar. Em Pisa, achamos que chegaríamos e daríamos de cara com uma torre que nos guiaria pelas ruas, como que nos chamando em sua direção. Que nada. Rodamos, rodamos, rodamos. E ainda mais pra sair. Nunca vi como gostam das famosas rotundas, que fazem você parar, olhar para um lado, para o outro e, na maioria a das vezes, continuar em frente.

Chegamos a Bergamo, nosso destino final, o aeroporto, as 3h da manhã, sendo que nosso voo saía às 8h30. No melhor estilo perrengue parte 4 decidimos ficar direto no aeroporto, sendo que alguém teria que ficar no carro para devolvê-lo no dia seguinte.

Resultado: saquei todas as roupas da minha mala, enrolei os pés, fiz travesseiro e cobertor e deitei ali como se fosse a melhor cama do mundo. Obviamente não consegui dormir um segundo, porque além do desconforto, que nem era o pior, meu pés pareciam dois picolés de tão gelados, já que fazia quase 0 graus lá fora e as dondoconas aqui, eu e minha inseparável companheira Ana, achamos que íamos ficar quentinhas dentro do carro. Ligamos o ar quente, viramos pra lá e pra cá e nada. Tão logo começou a amanhecer, apareceu o ônibus que nos levaria até o aeroporto. Ali, pelo menos, estaríamos mais quentinhas. E foi o que fizemos. Encontramos nossas amigas em um estado tão conservado quanto o nosso, esperando pelo que seria o voo dos infernos. Esse do qual já falei no post anterior.

E olha, nada disso tirou o fato de ter sido uma viagem mágica e quase perfeita, porque a Itália é linda, as paisagens incríveis, a comida incomparável, os italianos, com seu sangue quente, chiques e cheirosos e o que dá mesmo, depois de tudo isso, é vontade de voltar. Quem sabe logo mais!

E ainda conto aqui a experiência comida-arte-paisagem. No próximo...

Esse vídeo define perfeitamente o que é a Itália :-)

terça-feira, 9 de março de 2010

Meu santo é forte


Minhas mão suavam. Eu ria sem parar. De nervoso. O piloto falou: Vamos aterrissar no aeroporto de Reus. Eu entendi: agora é só rezar pra Deus.

Depois de 1h30 de atraso na saída do voo Milão-Barcelona, de vários avisos para não tirar o cinto durante a viagem e do anúncio de que o avião estava pronto para baixar, tipicamente seguido por aquele movimento de descida nada simpático, o comandante avisa que não vai conseguir pousar em Girona. O avião volta a subir e a fazer aquele barulho de motor de carro 1.0 ladeira acima. Jurei que nunca mais viajaria de Ryanair. Merda, quem manda ser pobre.

Seguimos para Reus, que é o aeroporto ao sul de Barcelona. Cacete. Estou ainda mais atrasada para o trabalho. Se meu chefe soubesse quanto eu queria estar sentada na minha mesa, quietinha... Alguns minutos depois, meu suor continua acelerado. Depois de começar a descer, voltamos a subir. Silêncio. O piloto então avisa que tampouco poderíamos aterrissar em Reus. Ou seja, acho que vamos ficar passeando no céu, na tormenta. A saída é apresentada: vamos para Barcelona.

Aí descubro que meu santo é realmente forte, porque ao primeiro anúncio de que Girona não nos receberia disse às minhas amigas: "bem que poderíamos aterrissar em Barcelona, então, né..." e na sequência mais uma prova: quando reclamo que vamos morrer com o prejuízo da passagem Girona-Barcelona que havíamos comprado, os italianos sentados a nossa frente compram nosso bilhete, depois de serem convencidos por uma catalã muito simpática, vizinha de poltrona e com pena de cinco estudantes de bolsos vazios vendo se esvair seus 11 sofridos euros.

Para completar o dia, foi a neve em Barcelona. E não foi uma nevinha não. Foi uma nevasca. Como não se via há 30 anos, 60, 150, sei lá. Segundo os mais exagerados, nunca se havia visto. Só sei que o fato, além de me proporcionar uma vista incrível da janela do trabalho, fez com que o dia terminasse melhor: não tive aula e pude ir direto pra casa, ainda com a mala da viagem, depois de passar a noite tentando dormir no estacionamento do aeroporto, com os pés congelados, e de dois dias sem conseguir tomar banho. Ops, acho que não era pra contar esse detalhe... mas continuo no próximo texto, finalmente sobre o fim de semana increíble na querida e vizinha bota, "sob o sol da Toscana".





quarta-feira, 3 de março de 2010

Esse texto é pro meu amigo Davi



Eu sei que tem muita gente que lê esse blog diariamente, semanalmente, quando lembra, nunca, sei lá... mas ele, especialmente, me pediu uma atualização, me disse que todos os dias acessava e que gostava, sinceramente, de ler meus textos. Vindo do Davi, me senti lisonjeada. Ele é um dos caras mais críticos que conheço, por isso foi escolhido para ser meu parceiro no TCC, já que eu também não fico muito atrás no quesito chatice quando o assunto são textos, correções, formas.

Bom, voltando ao Davi. Quero que ele personifique aqui a maioria dos meus amigos. Todos talvez não seja possível, já que tenho alguns de muitos anos, desde Borborema, mas pelo menos aqueles que conheci na fase mais recente da minha vida, em SP ou em Barcelona. O Davi me conheceu na faculdade. Depois de pouco tempo de amizade teve coragem de ser sincero comigo e disse que quando me viu pela primeira vez teve medo da minha pessoa. Imagina que imagem boa eu transmitia hein.

Bom, ele não foi o único. Muita gente dizia isso. Hoje, acho que as pessoas têm uma primeira impressão diferente. Obviamente, hoje eu também sou uma pessoa bastante mudada, pra melhor espero, mas enfim... isso não vem ao caso.

Fato é que ele não teve medo e aceitou o desafio de ser meu amigo. Resultado: é tema do blog de hoje. E olha que isso foi há 8 anos (Deus, como estamos velhos). Passamos quatro anos agarrados dentro do labirinto da Cásper e sábados consecutivos num antigo prédio da Praça da República, tema do nosso livro de final de curso. Juntos, "perdemos" nosso melhor amigo dos tempos da faculdade. Saímos diversas vezes para comer, poucas para beber, algumas para jogar boliche, war ou ver minhas intermináveis fotos de viagem - todas, sem exceção, pra nos divertir e dar muita, muita risada.

Ele é também um dos caras mais inteligentes que eu conheço. E mudou quase completamente desde nosso primeiro tête-à-tête. Sua personalidade, que é o que tem de melhor, continua lá, mas hoje em dia é uma pessoa muito mais doce e aberta. Conseguiu ser melhor do que já era.

Com ele eu dividi yakissobas no escadão da Gazeta, andei de ônibus sem ter dinheiro pra pagar. Foi ele quem me emprestou um vídeo cassete, no idos da mais profunda pobreza da vida de estudante, pra poder saciar minha fúrias pelos filmes. Foi ele que enxugou minhas lágrimas quando escrevemos "the end" no capítulo faculdade.

Sabe esses amigos para os quais você nunca precisa dizer muito? A gente se entende. Detalhe: ele é aquariano e isso representa uma boa parcela das pessoas mais importantes da minha vida.

Davi, você aqui representa aqueles amigos, todos, que me apóiam e consolam, com quem comparto alegrias e que, principalmente, me deram carinho quando estava machucada, física e emocionalmente (jamais esquecerei de vocês entrando pela porta do hospital com um pacote de carolinas, quando a visita já havia acabado).

Baita responsa, mas eu sei, você dá conta. :-)









terça-feira, 2 de março de 2010

Make sure the fortune that you seek is the fortune that you need


Sabe aquela luz no fim do túnel que buscamos continuamente e que nos faz acordar todos os dias motivados a realizar nossos sonhos? Fiquei pensando esses dias que, no final, ela pode ser nada mais do que um carro vindo ao nosso encontro ou, não sei, um poste.

Me explico.

Assisti Up in the Air. Muita gente deve ter visto também. Pois fiquei pensando depois do filme, num domingo à noite, em tudo que acabara de ver e ouvir. Tá certo que dei muita risada, em algumas cenas. Minha amiga Ana até me repreendeu em alguns momentos, dado o escândalo que fazia toda vez que ria. Típico.

Bom. Basicamente o que consegui resumir na minha cabeça foi que às vezes nos propomos alcançar certos objetivos, pelos quais lutamos incansavelmente e que, ao final, se revelam estúpidos e nada compensadores. E isso pode ser dar por dois motivos: 1) porque era realmente estúpido e só você seria capaz de achar que aquilo te faria feliz; 2) porque no meio de tudo você descobre uma outra possibilidade que realmente pode te realizar, muito longe do que você imaginava.

A verdade é que fiquei pensando: até que ponto colocamos barreiras para as coisas que podem chegar até a gente durante o percurso? Até que ponto limitamos nosso olhar apenas para a frente, sem nos permitir uma perspectiva de tudo que nos rodeia? Acredito que não deve haver nada mais triste que viver sem sonhar, mas e sonhar por algo que ao final se revela frustrante? Inútil?

Ouvindo música hoje, complementei meu pensamento: temos que lutar, e muito, pelo que queremos. Mas também temos que permitir que as coisas boas que aparecem pelo caminho possam mudar nossa rota ou passar a fazer parte dela. A letra, conhecida, diz assim: "make sure the fortune that you seek is the fortune that you need".

Exatamente.