domingo, 28 de março de 2010

Eu, Woody Allen e o Palau de la Música Catalana







































Eu sou capaz de pegar o metrô em vez do táxi ou de andar um montão a pé só pra economizar 2 euros, de olhar todos os preços no supermercado, para quase sempre comprar o mais barato. O que eu não sou capaz, quase nunca, é de perder oportunidades de viver experiências memoráveis. Hoje vivi uma delas.

21h. Estou eu sentadinha esperando que comece o concerto de ninguém menos que Woody Allen, acompanhado de sua banda de jazz, no nada menos incrível Palau de la Música Catalana. Poderia haver combinação mais especial?

O Palau é uma dessas jóias da arquitetura de Barcelona, que eu não me canso de admirar. Nunca tinha estado dentro e por isso resolvi chegar antes do show, pra poder observá-lo com dedicação. Foi o que fiz. De onde estava sentada, estrategicamente na lateral e no andar de cima, não tinha a melhor visão do palco, mas podia ver o Palau em todos os seus ângulos, cores e curvas. Boquiaberta, acomodei-me a esperar.

Estava tão besta, que não reconheci uma companheira do trabalho, que me cumprimentou e ficou no vazio, enquanto eu continuava no meu autismo olhando o teto, os pilares, os vitrais... Vergonha, não sabia o que fazer depois.

Em alguns minutos, os músicos entraram, tomando suas posições. Piano, violoncelo, bateria, metais. Os metais. Ele chegou assim, miudinho, andando devagar. Os cabelos brancos, aqueles óculos grandes, sapatos que parecem sobrar nos pés. Sentou-se e começou a soprar.

Nessa hora, eu já estava chorando. Foi imediato, assim que o pianista sentou a dedilhar. Não porque que a música fosse bonita. Também. Sim porque sempre que vivo experiências como essa imagino que não as podemos deixar passar nunca na nossa vida. A situação, basicamente, era a seguinte: eu estava sentada em um patrimônio histórico da humanidade, símbolo da arquitetura modernista catalã e com mais de 100 anos de história. Em cima do palco, a incrível banda de um gênio. Não sei dizer se ele é genial fazendo jazz, só sei dizer que ele é genial fazendo cinema e por isso eu estava incrivelmente feliz em estar ali, em dividir aquele espaço com alguém que fez o que ele fez.

Não à toa, me arrepiei e meus olhos se encheram de lágrimas quando ele disse: "É muito bom estar de volta. Barcelona é um dos meus lugares favoritos no mundo" Eu lembrei de "Vicky, Cristina, Barcelona", de como ele mostrou a cidade, de como eu me encantei com o filme, de como projetei minha vida aqui, de como a música ficou na minha cabeça. Lembrei de Match Point, Melinda & Melinda, Manhatan. Lembrei de que esse momento não sairia tão cedo da minha memória visual, auditiva, sentimental.

Lembrei que vivia em uma das cidades mais bonitas do mundo, e isso estava ainda bem fresco na minha memória, já que durante o dia, com o sol brilhando e a semana santa européia rolando, Barcelona estava lotada de gente, caminhando, olhando mapas, tirando fotos. Tenho um orgulho enorme de viver aqui. Um amor que adquiro a cada dia pela cidade, pela forma como surgiu, como foi pensada e estruturada. E pela forma como é possível descobrir nela uma coisa mais bonita todos os dias.

Eu sempre tento não deixar de viver experiências incríveis como a de hoje, nem que isso exija semanas de economia mais forçada. Vale a pena. Até porque tudo que é bom sempre exige mais esforço. Woody Allen merece. O Palau também. Meus ouvidos e meus olhos agradecem. Minha memória também.



4 comentários:

  1. Ah, tô morrendo de saudade de você!
    E cada vez que leio, sinto mais.

    Beijo, Ju

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  2. Fala a verdade... Lembrou de mim também, né, mu?
    Ver o Woody Allen tocando jazz é sentir-se em um filme dele.. e não é todo dia que nossa vida é um filme tão bem dirigido. Love you!
    Ana Luiza

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  3. Que lindo texto Jaque! Adorei! O PALAU de la MUSICA têm uma aura especial e você percebeu... E é por causa dessa arquitectura toda que o som fica ainda mais celestial... Pode ser um show de jazz, violão e vos, so voz, Woody Allen, PoP rock e atè heavy metal, qua vai ter a mesma AURA...

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  4. Ah, Ju! Eu tb!

    E, muuuu, sim, eu lembrei de você lá, não teve jeito :-)

    Martita,

    Será que um funk também iria bem no Palau? rs... Talvez! :-0

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